As sutis armas que nos matam
Texto de Charlotte Lorelei Oliveira. Publicado originalmente em 6 de novembro de 2015, em seu perfil do facebook.
“As sutis armas que nos matam”
Chamo-me Charlotte, sou uma mulher trans. Poucas pessoas sabem disso pois ainda estou no começo de minha transição. Ainda assim, existe dentro de mim um grito, um urro por liberdade pois mesmo tendo sofrido pouquíssimos ataques transfóbicos, ainda estou sujeita aos que são amplamente ditos na internet - e na vida real - dia a dia.
Começo pelo nome, pois o nome é o que me identifica, o que me torna uma pessoa única e humana. O nome tem em si um enorme poder - tanto que diversas religiões o vêem com enorme significado simbólico. Existem pessoas e, também, vertentes de movimentos sociais que se recusam a aceitar nosso nome - expressão de quem somos - e buscam, invés disso, subjugar-nos a um nome que não é nosso, aquele de nosso registro. Se um nome tem tanto poder e é o que nos torna pessoas únicas e íntegras, quando nos tiram o direito a nosso nome estão retirando-nos o direito de existir como pessoas e nos reduzindo a coisas - ou até menos que isso pois tentam retirar nosso direito de simplesmente existir.
Não bastando isso, essas mesmas pessoas nos condenam por mexermos em nossos corpos para os adequar a como nos vemos - a como somos. Vêem isso como um sintoma de alguma doença - e inclusive, a mediCISna armada da pCISquiatria nos patologiza como doentes mentais simplesmente por não nos encaixarmos a suas imposições de gênero - e querem nos suprimir, nos convencer de que isso é uma loucura, uma forma de enganar os outros e a nós mesmos de que seríamos algo que não somos quando na verdade, quem além de nós pode saber o que exatamente somos?
Quando dizemos “ame seu corpo”, queremos dizer que não devemos nos submeter ao crivo alheio para nos sentirmos pessoas bonitas e plenas e não “você tem de engolir como seu corpo é” como vocês dizem com essas mesmas palavras.
Armam-se dessas sutis armas de discriminação, expõem-nos, constrangem-nos, excluem-nos, retiram-nos nosso direito a nosso corpo, nossa identidade e nossa cidadania e, no fim, alegam que não são culpados pelo que ocorre com as pessoas trans neste país - prostituição, miséria e assassínio.
Saibam que suas palavras e seus atos são os dedos que puxam o gatilho das armas que nos matam, são os “não” que ouvimos em todas entrevistas de emprego, são as correntes que nos prendem à exclusão. Nós resistiremos a tudo isso e, conforme nos organizamos - e já estamos fazendo isso -, reivindicaremos nossos direitos a qualquer custo, passando por cima de todo esse vergonhoso CIStema.
Por fim, se meu corpo é meu jardim, plantarei as flores que mais me agradam e se meu nome são pássaros, que voem e espalhem suas cores invés de ficarem presos para não incomodar a transfobia dos outros.
Imagem: Carol Rossetti.
“Saibam que suas palavras e seus atos são os dedos que puxam o gatilho das armas que nos matam, são os “não” que ouvimos em todas entrevistas de emprego, são as correntes que nos prendem à exclusão.”
Adorei isso! triste verdade!